3487/2022
Data da Disponibilização: Segunda-feira, 06 de Junho de 2022
Tribunal Superior do Trabalho
JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. INEXISTÊNCIA DE
CONTRATO NULO. AUSÊNCIA DE INTERFERÊNCIA DO
ESTADO. TRANSCENDÊNCIA. NÃO RECONHECIMENTO.
A questão devolvida a esta Corte Superior versa sobre a pretensão
do Estado do Amapá de reconhecimento da nulidade da
contratação do reclamante por meio de Unidade Descentralizada de
Educação (UDE), pessoa jurídica de direito privado, prestadora de
serviços ao ente público reclamado, em face da ausência de
submissão a concurso público.
A parte reclamada, em síntese, afirma "possuir interesse jurídico e
econômico na lide, eis que este é quem suporta o ônus das
condenações trabalhistas em face das Caixas Escolares e das
UDE'S".
Alega, ainda, que "que o referido contrato fora realizado de forma
contrária ao estabelecido pela Norma Ápice, em seu art. 37, II (CF)"
e que "a decisão recorrida teve por fundamento jurídico a tese de
que as contratações feitas pela UDE e Caixas Escolares dispensam
a seleção em concurso público, embora o contratado trabalhe
fazendo às vezes de servidor público. Ocorre que, em verdade, o
interesse público resta desprezado pela realização de contratações
DIRETAS completamente arbitrárias e ao sabor das correntes
políticas, favoritismos e conveniências dos gestores".
Aponta violação do art. 37, II, §2º da Constituição da República e
contrariedade à Súmula n° 363 do c. TST.
Transcreve arestos e sentença para demonstração de divergência
jurisprudencial.
Ao exame
Nos termos do art. 896-A da CLT, no recurso de revista, cabe a esta
Corte Superior examinar, previamente, se a causa oferece
transcendência sob o prisma de quatro vetores taxativos
(econômico, político, social e jurídico), que se desdobram em um rol
de indicadores meramente exemplificativo, referidos nos incisos I a
IV do dispositivo em apreço.
Cumpre destacar que o vocábulo "causa", a que se refere o art. 896
-A, caput, da CLT, não tem o significado estrito de lide, mas de
qualquer questão federal ou constitucional passível de apreciação
em recurso de revista. O termo "causa", portanto, na acepção em
referência, diz respeito à questão jurídica, que é a síntese normativo
-material ou o arcabouço legal de que se vale, em certo caso
concreto, como instrumento de resolução satisfatória do problema
jurídico.
É síntese, porque resultado de um processo silogístico. É
normativo, por se valer do sistema jurídico para a captura e criação
da norma. É material, em razão de se conformar e de se identificar
com um dado caso concreto.
Enfim, a questão jurídica deve ser apta a individualizar uma
categoria jurídica ou um problema de aplicação normativa como
posta, deduzida ou apresentada.
Ausente a transcendência política, que tem como pressuposto a
violação à segurança jurídica, que envolve "um estado de
cognoscibilidade, de confiabilidade e de calculabilidade", como
assinala Humberto Ávila em Teoria da Segurança Jurídica, 4ª
Edição, ver. Atual. E ampl. - São Paulo : Malheiros, 2016, p. 2018).
De cognoscibilidade porque o Direito deve ser claro e preciso. De
confiabilidade, porque deve ser estável. De calculabilidade, para
proteger a face da transição do presente para o futuro, garantindo a
previsibilidade do Direito.
Significa dizer que "poderá haver Direito injusto ou falho, mas nunca
inseguro, pois a ausência de segurança nega a essência mesma do
jurídico" (L. Recaséns Siches, Filosofia del Derecho, México,
Porrúa, 1959, p. 224).
Código para aferir autenticidade deste caderno: 183591
7381
No caso, como dito, o tema não oferece transcendência política,
pois, não se detecta contrariedade, pelo Tribunal Regional, a
súmula ou orientação jurisprudencial do TST, a súmula do STF ou a
decisões oriundas dos microssistemas de formação de precedentes,
de recursos repetitivos ou de repercussão geral.
Em relação ao tema ora recorrido, a Corte Regional consignou que
"a contratação do reclamante deu-se diretamente com a primeira
reclamada (Caixa Escolar Professora Maria Carmelita do Carmo),
pessoa jurídica de direito privado, legalmente constituída, sem
interferência do segundo demandado (Estado do Amapá),
considerando que o demandante não postula o reconhecimento de
vínculo empregatício com o ente público, daí porque não há que se
falar em nulidade do contrato." (fls.172 PDF).
Registrou ainda que "a contratação do reclamante ocorreu por
análise curricular, sem comprovação de que houve interferência do
ente público (Estado do Amapá)" (fls. 176- PDF).
O Tribunal Regional, soberano no exame do conjunto fáticoprobatório afirmou expressamente que a contratação do reclamante
ocorreu por análise curricular, diretamente com a primeira
reclamada (Caixa Escolar Professora Maria Carmelita do Carmo),
pessoa jurídica de direito privado, legalmente constituída, sem
comprovação de interferência do ente público (Estado do Amapá), e
que a parte autora não postula o reconhecimento de vínculo
empregatício com o ente público.
Nesse contexto, as alegações da parte recorrente encontram óbice
na Súmula n° 126 desta Corte, pois a reclamante não foi contratada
pela Administração Pública, não sendo, pois, necessária submissão
a prévio concurso público.
Sendo assim, não foi violado o artigo 37, II, § 2º, da Constituição da
República, tampouco contrariada a Súmula nº 363 do TST, pois não
houve reconhecimento de vínculo empregatício entre a parte
reclamante e o Estado do Amapá. E, cuidando-se de contrato
trabalho de natureza privada, não há como ser reconhecida a
nulidade por ausência de concurso público.
A decisão regional, tal como proferida, encontra-se em
conformidade com o entendimento deste Tribunal Superior do
Trabalho, inclusive desta 7ª Turma, no sentido da validade da
contratação efetuada pelo Estado do Amapá por meio de Unidades
Descentralizadas de Educação (UDEs) ou Caixas Escolares,
consoante os seguintes julgados:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA.
INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017.
ALEGAÇÃO DE CONTRATO NULO - CONTRATO DE TRABALHO
FIRMADO COM ENTIDADE PRIVADA - ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA TOMADORA DE SERVIÇOS - INAPLICABILIDADE DA
SÚMULA Nº 363 DO TST - TRANSCENDÊNCIA NÃO
EVIDENCIADA. Conforme preconiza o artigo 896-A da CLT, com
redação atribuída pela Lei nº 13.467/2017, antes de se examinar os
pressupostos intrínsecos do recurso de revista, faz-se necessário
verificar se a causa oferece transcendência. No caso, o recurso de
revista não atende nenhum dos requisitos do art. 896-A da CLT.
Com efeito, vê-se, do quadro fático-probatório delineado pelo TRT
(Súmula 126 do TST), que ficou consignado que a reclamante não
foi contratada pela Administração Pública para que dele fosse
exigido a prestação de concurso público. Mas sim por pessoa
jurídica de direito privado. Nesse contexto, não se verifica violação
ao artigo 37, II, § 2º, da Constituição Federal, visto que, não tendo
ocorrido o reconhecimento do vínculo do Estado com a reclamante,
não há como ser reconhecida a necessidade de submissão a
concurso público. Precedentes. Agravo de instrumento conhecido e
desprovido" (AIRR-176-41.2019.5.08.0203, 7ª Turma, Relator