TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.213 - Disponibilização: segunda-feira, 7 de novembro de 2022
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do Poder Público em conceder o reajuste da tarifa, omissão do Poder Público em custear as gratuidades e omissão do Poder
Público em realizar a fiscalização do Transporte Clandestino (motos, vans, carros de passeio, etc), conforme cópia em anexo”.
Afirma que “cumprindo o que foi acordado com o Poder Público, a impetrante não interrompeu a execução dos serviços e aguardou o cumprimento das obrigações assumidas em ata de reunião pela Administração. Aos 12/05/2021, foi publicado no Diário Oficial do Município, o Decreto Municipal nº 236, que autorizou a impetrante a reajustar o valor da passagem do transporte coletivo
municipal para R$ 3,00 (três reais), conforme cópia em anexo, o que sinalizou o início do cumprimento das obrigações assumidas
em ata pela Prefeitura Municipal. 4 Aos 14/05/2021, a impetrante recebeu 05 notificações extrajudiciais da Prefeitura Municipal,
conforme cópias em anexo, solicitando: 1) Balanço contábil e demonstrativo de valores arrecadados com tarifa; 2) Retomada da
prestação dos serviços durante os finais de semana e feriados a partir de 15/05/2021; 3) Certidões Negativas de Regularidade
Fiscal, Trabalhista e da Justiça Comum; 4) Adequação dos Veículos com vistas a garantir a acessibilidade, atendendo a Pessoa
com Deficiência e com Mobilidade Reduzida; 5) Relatório quanto às rotas, dias e horários de execução do serviço de transporte
coletivo, bem como acessibilidade aos ônibus e quantidade de veículos que atendem às demandas; Todas as notificações foram
respondidas pela impetrante, com o envio dos documentos e informações solicitadas, conforme provam os documentos em anexo, devidamente protocolados aos 07/06/2021 nas Secretarias requisitante”.
Sustenta que no dia 30/06/2021 foi surpreendida com uma notificação subscrita pela primeira autoridade coatora reconhecendo
a irregularidade da prestação de serviços de transporte público coletivo pela empresa Lorentur Agência de Viagens Ltda., CNPJ/
MF nº inscrita no CNPJ nº 04.689.971/0001-41, determinando a imediata suspensão de qualquer atividade em favor do Município, ficando proibido qualquer pagamento a este título, em virtude da precariedade da relação jurídica decorrente da inexistência
de Contrato Administrativo válido.
Requereu, ao final, a concessão da segurança “declarando-se a nulidade do ato administrativo proferido pela primeira autoridade
coatora, publicado no Diário Oficial do Município aos 29/06/2021, reestabelecendo-se os efeitos do contrato administrativo nº
1493/2012 até a realização de regular processo licitatório, bem como declarando-se a nulidade do contrato emergencial de nº
340/2021, decorrente da dispensa de licitação nº 057/2021”.
Juntou documentos.
Informações prestadas e documentos juntados às fls. 53/55 dos autos digitais.
Manifestação da impetrante à fl. 57 do caderno digital.
O Ministério Público do Estado da Bahia emitiu parecer pela denegação da segurança.
Vieram os autos conclusos.
É o necessário a relatar. Passo a fundamentar e decidir.
Conforme dispõe o art. 1º da Lei n. 12.016/09, o mandado de segurança é instrumento de proteção de direito líquido e certo,
sempre que alguém tiver direito violado ou ameaçado por ilegalidade ou abuso de poder cometido por autoridade.
Colhe-se da doutrina brasileira que o direito líquido e certo é aquele direito decorrente de fato certo e passível de comprovação
de plano, através de prova pré-constituída inequívoca. Segundo Cássio Scarpinella Bueno, “o direito líquido e certo é justamente aquele direito cuja existência e delimitação são claras e passíveis de demonstração documental” (Mandado de Segurança,
Scarpinella Bueno, Cássio, p. 15, 2009).
Os documentos que acompanham a inicial não evidenciam a existência de direito líquido e certo da impetrante. Nada há prova
documental nos autos que aponte ilegalidade ou abuso de poder das autoridades impetradas.
A documentação juntada aos autos revela que em 18 de dezembro de 2012 fora celebrado, entre a impetrante e o Município de
Santo Antônio de Jesus, o contrato emergencial n. 1493/2012, para prestação e exploração de serviço de transporte coletivo
de passageiros, mediante dispensa de licitação, pelo prazo de noventa dias, prorrogáveis por igual período (Cláusula primeira).
Não obstante, a despeito do vencimento do prazo do referido contrato, a impetrante continuou a prestar seus serviços de forma
precária nos anos que se seguiram, até a prestação do serviço ter sua irregularidade reconhecida através de ato do atual Prefeito
Municipal, publicado no dia 29/06/2021.
O art. 24, IV, da Lei n. 8.666/93 estabelece que é dispensável a licitação “nos casos de emergência ou de calamidade pública,
quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de
pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo
máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada
a prorrogação dos respectivos contratos” (grifei).
Como consectário, não paira nenhuma dúvida sobre a irregularidade da continuação da prestação do serviço da impetrante ao
Município de Santo Antônio de Jesus, diante da flagrante violação ao disposto na legislação de regência.
Fixada essa indiscutível premissa, passo a examinar os argumentos da impetrante.
De início, merece ser refutada a invocação do princípio da proibição de comportamento contraditório (venire contra factum proprium), pois de atos nulos não se originam quaisquer direitos, conforme entendimento há muito firmado pelo Supremo Tribunal
Federal (Súmula n. 473).
Logo, a mera realização de tratativas para o reequilíbrio da equação econômico-financeira do instrumento contratual não impede
que a Administração, verificando situação de incontestável ilegalidade, proceda à anulação do contrato ilegal.
Também não prospera a alegação de violação às garantias do contraditório e ampla defesa.
Sobre o ponto, são bastante didáticas as conclusões das informações das autoridades coatoras:
“Ante o exposto, em síntese, informamos o seguinte: 1. em 03/05/2021 a Impetrante requereu reequilíbrio econômico-financeiro
do contrato 1493/2012 sem apresentar documentação que demonstrasse qual a efetiva equação econômica da avença para
fins de aferir em que medida ela se desequilibrou; 2. uma semana após, em 10/05/2021 foi instaurado o processo administrativo
4672/2021 para rescisão do contrato; 3. ao longo da instrução do processo administrativo 4672/2021 verificou-se que não havia
regularidade jurídica na prestação dos serviços, haja vista o decurso de prazo do contrato 1493/2012, tornando-o inválido, sem
qualquer aditivo ao longo dos anos seguintes (o que não lhe tornaria mais legítimo, por força da proibição do art. 24, IV da Lei
8.666/93); 4. em 28/06/2021 (55 dias após o pedido da Impetrante e imediatamente após constatar a irregularidade da avença)