TJPA - DIÁRIO DA JUSTIÇA - Edição nº 7326/2022 - Quarta-feira, 9 de Março de 2022
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vagina.          Quanto às três testemunhas de defesa (sendo duas delas informantes),
limitaram-se a aduzir que o acusado nunca praticou abusos sexuais contra a vÃ-tima, bem como que nunca
presenciaram comportamentos inadequados do acusado com a vÃ-tima. Além disso, a própria mãe da
vÃ-tima alegou que a vÃ-tima ficava revoltada pelo fato de não poder se maquiar ou sair sozinha, e por
isso, talvez tenha inventado a acusação.          Com efeito, entende-se que as
testemunhas buscaram, verdadeiramente, desacreditar e menosprezar a vÃ-tima, mormente a própria
mãe, o que não pode ser admitido. De fato, os depoimentos das testemunhas de defesa buscam,
inadvertidamente, culpar a vÃ-tima e, por isso, não são suficientes para derrubar o arcabouço
probatório no sentido de que o acusado não praticou o assédio sexual.          Oportuno
frisar que, em crimes dessa natureza, a palavra da vÃ-tima recebe especial importância, conforme
pacÃ-fica jurisprudência:          à cediço por este Tribunal Superior que a palavra da
vÃ-tima, como espécie probatória positivada no art. 201 do CPP, nos crimes praticados - Ã
clandestinidade - no âmbito das relações domésticas ou nos crimes contra a dignidade sexual, goza
de destacado valor probatório, sobretudo quando evidencia, com riqueza de detalhes, de forma coerente
e em confronto com os demais elementos probatórios colhidos na instrução processual, as
circunstâncias em que realizada a empreitada criminosa. [...] (STJ. AgRg no AREsp 1275084/TO, Rel.
Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 28/05/2019, DJe 05/06/2019) Â Â Â Â Â Â Â Â Â E,
nesse caso, vale mais uma vez salientar, que a palavra da vÃ-tima foi clara e congruente sempre, aliada
aos depoimentos da sua tia e do seu pai. Nessa toada, constato que todo o arcabouço probatório,
somado à palavra da vÃ-tima, corroboram o fato criminoso objeto da ação penal.         Â
Com efeito, não há motivo algum para que a vÃ-tima criasse e insistisse nas narrativas de abuso sexual
sofridos nas mãos do seu padrasto, o acusado Alailson.          Portanto, todas estas
circunstâncias, além dos depoimentos harmônicos da vÃ-tima, da sua tia e do seu pai, autorizam
concluir, além da dúvida razoável, a empreitada criminosa praticada pelo acusado.         Â
Com todos esses elementos, não há motivos para acatar a tese defensiva de ausência de provas. Ao
contrário, está substancialmente comprovado o fato narrado, em que o acusado teria beijado a boca da
vÃ-tima, lambido os seus seios dela e acariciado a vagina dela desde quando era criança de tenra idade,
aos 9 anos, fato este que configura o estupro de vulnerável, já que a conjunção carnal não é
requisito para a configuração do crime.          No que tange à tipificação penal, muito
embora o Ministério Público ter capitulado apenas como incurso no art. 217-A do CP, está presente a
relação de parentesco, visto que o acusado é padrasto da vÃ-tima, sendo que convivia com ela na
mesma casa desde quando ela tinha 3 anos de idade, como devidamente narrado na denúncia. DaÃ- por
que se mostra possÃ-vel a causa de aumento de pena prevista no art. 226, II do CP. Devo salientar que tal
fato foi devidamente narrado na denúncia e debatido no curso da instrução processual.       Â
  Assim, pelos fatos demonstrados alhures, aplico o art. 383 do CPP para realizar a emendatio libelli e
alterar a tipificação da conduta do acusado para o art. 217-A c/c art. 226, II do CP, de maneira que
considero a causa de aumento, como doravante se verá, na dosimetria da pena.         Â
Dessa forma, entendo que o elemento volitivo restou evidenciado, uma vez que o réu agiu com
consciência e vontade para o fim de praticar abuso sexual contra uma criança de tenra idade, sua
enteada, que possuÃ-a 9 anos de idade à época. Por isso, a tipificação é apropriada ao fato que se
amolda à espécie prevista no art. 217-A c/c art. 226, II do CP, como já referido.         Â
Inexistindo qualquer causa excludente da antijuridicidade ou de culpabilidade, ônus que incumbia ao
réu alegar e comprovar (de acordo com a teoria da ratio cognoscendi adotada pelo direito brasileiro),
impõe-se a condenação pelo delito nos termos descritos alhures.          III DISPOSITIVO          ISSO POSTO, julgo procedente a denúncia para condenar o réu
ALAILSON GOMES RODRIGUES, vulgo CUIÃ, como incurso nas sanções do art. 217-A c/c art. 226, II
do CP.          Atento ao que dispõe o art. 68 do CP, passo à dosimetria da pena.     Â
    Na primeira fase, considerando as circunstâncias do art. 59 do CP, constato:         Â
a) a culpabilidade se mostra desfavorável ao réu, uma vez que o juÃ-zo de reprovabilidade da conduta
extrapola o tipo penal na medida em que abusou sexualmente de uma criança de tenra idade. Vale dizer,
não era uma criança que já entendia minimamente de aspectos sexuais, mas sim de criança de
apenas 9 anos de idade, ingênua, que sequer entendia o que estava acontecendo. Isso demonstra a
elevada culpabilidade do acusado. Nesse sentido: ¿No caso de prática do crime de estupro de
vulnerável, a tenra idade da vÃ-tima é fator que legÃ-tima a exasperação da pena-base para além
do mÃ-nimo legal. [...]¿ (AgRg no HC 599.330/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÃVIO DE NORONHA, QUINTA
TURMA, julgado em 03/08/2021, DJe 06/08/2021);          b) não há antecedentes;    Â
     c) sem elementos para valorar conduta social.          d) sem parâmetros para
averiguar a personalidade réu, uma vez que ausente laudo psicossocial nos autos, de maneira que